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29/06/2021

Recomendação sobre «A escola no pós-pandemia: desafios e estratégias»

 Recomendação n.º 1/2021

Sumário: Recomendação sobre «A escola no pós-pandemia: desafios e estratégias».

A Escola no pós-pandemia: desafios e estratégias





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A Escola no pós-pandemia: desafios e estratégias

Preâmbulo

No uso das competências que por lei lhe são conferidas, e nos termos regimentais, após apreciação do projeto de Recomendação elaborado pelo(as). Conselheiro(as) Relator(as) Cristina Vieira; Jorge Ascenção e Lurdes Figueiral o Conselho Nacional de Educação, em reunião plenária de 9 de junho de 2021, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo a presente Recomendação.

A Escola no pós-pandemia: Desafios e estratégias

Recomendação do Conselho Nacional de Educação tendo em vista o desenho de estratégias e medidas para reduzir, nas escolas, os impactos socioeducativos da pandemia e potenciar o desenvolvimento e o progresso na aprendizagem de crianças e jovens

Introdução

No sentido de tentar reduzir os impactos negativos da pandemia, no regresso ao ensino presencial, o Conselho Nacional de Educação (CNE) tem vindo a refletir sobre as necessidades educativas nos próximos anos letivos. As recomendações aqui apresentadas são fruto da análise de vários documentos e estudos internacionais e nacionais, da audição de vários especialistas e do trabalho que este Conselho realizou através da consulta das Comissões Especializadas mais diretamente relacionadas com a temática em questão(1).

Estas recomendações têm como base uma visão da escola e da comunidade escolar como um todo (whole school approach), munida de autonomia que lhe permita conduzir os processos tidos por necessários, e inserida em territórios com especificidades próprias, cujos recursos devem ser convocados na procura conjunta de respostas aos desafios impostos pela pandemia. É ainda reconhecido o elevado sentido de missão dos profissionais docentes e não docentes, das famílias e das comunidades, que souberam responder com enorme dedicação e eficácia perante as situações emergenciais, tendo em vista o sucesso, a inclusão e a cidadania: os três pilares em que assenta o Plano 21|23 Escola+ recentemente apresentado pelo Governo.

Com a situação pandémica que atravessamos e as condições rigorosas de controlo da saúde pública, as diferentes gerações vivem dificuldades sérias e muito peculiares. As crianças e os jovens foram atingidos no que de mais importante há para o seu desenvolvimento, nomeadamente nas suas oportunidades de interação face a face para a descoberta do conhecimento e com fins de socialização. No entanto, se conseguirmos desenhar e implementar um conjunto de medidas poderemos concretizar as soluções mais adequadas e ajustadas às suas necessidades e expectativas, tendo como finalidade minimizar o impacte desta situação e criar as melhores condições para progredirem nas respetivas aprendizagens e também garantir a sua saúde física e psicológica e o seu bem-estar social. Trata-se da saúde individual e coletiva, numa perspetiva de sustentabilidade das gerações presentes e futuras. Continuar a trabalhar de forma sistémica para manter a escola a funcionar em regime presencial deve ter na sua génese uma visão humanista e integrada da sua missão e da atuação dos diversos atores envolvidos no processo educativo, em vez de residir em argumentos de natureza instrumental e funcionalista, como os amplamente divulgados nos media durante as diferentes fases do confinamento, de preparar alunos e alunas para os exames de acesso ao ensino superior, ou de ocupar as crianças e jovens menores de idade, para que os pais e mães pudessem trabalhar(2).

Se o fizermos, se o conseguirmos, esta experiência, mesmo que negativa, fará deles melhores cidadãos e cidadãs, pela descoberta e pela superação das suas capacidades, como o trabalho autónomo e as competências de utilização de ferramentas tecnológicas, o que foi testemunhado pelos próprios e que importa preservar e incrementar no regresso ao presencial.

Com a situação pandémica, famílias e escolas, (re)descobriram uma ligação entre si, em muitos casos negligenciada até então. Foi também reforçada socialmente a importância da família e das condições materiais de vida dos agregados familiares para o sucesso escolar de crianças e jovens. As famílias ficaram a conhecer melhor o trabalho desenvolvido pelas escolas, e os professores perceberam com maior clarividência a necessidade de valorizar o acompanhamento dos encarregados de educação na vida escolar dos filhos. Sabe-se que as dificuldades sentidas foram muito distintas por razões de diversa ordem, pelo que os que tiveram mais dificuldade terão que ter mais apoio. Há que encontrar as soluções mais ajustadas para que nenhuma criança ou jovem veja coartadas as suas possibilidades de sucesso. Não terão de, nem será tal possível, prosseguir todos ao mesmo ritmo e provavelmente nem todos com o mesmo objetivo, mas cada um pode e deve prosseguir de acordo com as suas capacidades, as suas necessidades e as suas expectativas. Para isso é importante que se dê prioridade ao bem-estar geral dos alunos, que envolve as dimensões cognitivas, emocionais, sociais e físicas e só nesse equilíbrio global, se criam as condições para a motivação para aprender e para encarar a escola como um recurso valioso para o futuro.

As recomendações aqui elencadas visam contribuir para robustecer a importância pública que a escola parece ter recuperado com a discussão em torno dos efeitos da pandemia, levando a que crianças e jovens não a percecionem como um castigo, mas sim como um espaço aprazível e capaz de alavancar o desenvolvimento humano e o progresso societal. Também não se defende a utilidade e a exequibilidade de fazer cálculos financeiros, ou outros, aos eventuais prejuízos derivados dos "dias perdidos", uma vez que a progressão nas aprendizagens deve ser enquadrada no âmbito de uma visão que realça a interdependência recíproca de fatores individuais e contextuais envolvidos no ato de ensinar e no processo de aprender. As propostas a desenhar implicam assim, e necessariamente, uma visão sistémica do sucesso educativo, qualquer que seja a idade considerada. Há ainda uma preocupação de evitar propor medidas que impliquem uma abordagem top down (exceto aquelas que efetivamente competem à tutela), pelo reconhecimento de que muitas das medidas desenhadas centralmente podem ter pouco a ver com as especificidades de escolas concretas, localizadas em territórios específicos, onde habitam crianças e jovens com determinadas idiossincrasias. Importa ainda fazer sugestões que tenham na sua base o fomento de uma cultura participativa, sem a ideia de policiamento do trabalho na escola e sem agudizar o trabalho burocrático dos professores, que deverão em vez disso ter agora mais tempo para a sua primordial e complexa tarefa educativa. Uma visão otimista dos efeitos da pandemia impele-nos a pensar que as gerações mais novas irão ficar certamente mais fortes e atentas à alteridade, fruto da consciência forçada do papel que a escola e o conhecimento podem ter para enfrentar crises inesperadas, da inevitável obsolescência da tecnologia e da fragilidade da condição humana, face a ameaças invisíveis ligadas a fatores de saúde ou outros, que nos convocam a refletir sobre o sentido da vida.

Embora não se devam aproveitar as situações excecionais para implementar profundas alterações no funcionamento social, essas mesmas situações excecionais podem ser a alavanca para essas mudanças. Por isso, estas recomendações visam, por um lado, medidas imediatas em que as escolas e as comunidades educativas se podem inspirar, e medidas a médio prazo que requerem, não só a vontade política, mas também a colaboração e participação de todos os parceiros educativos para a construção, em última análise, da Escola que desejamos. De tudo o que se afirmou, importa reter que é imperioso recomendar às escolas que não reforcem um modelo de ensino que já se tinha revelado ineficaz, seja pela ênfase excessiva na orientação para os resultados, seja pela adoção de metodologias de trabalho que poderão nem sempre responder a necessidades concretas da população escolar. E ainda que estas recomendações visem a Escola como um todo e toda a Escola, a sua pertinência é tanto maior quanto mais iniciais são os anos de escolaridade em que se atue e mais precoces as idades com que se trabalhe, desde a Creche e o Pré-escolar e com forte incidência no Ensino Básico.

Paralelamente a estas Recomendações, o CNE reuniu um conjunto de indicadores e elaborou uma reflexão mais alargada sobre esta mesma problemática, com contributos vários, incluindo conteúdos substantivos recolhidos no âmbito das onze audições efetuadas a pessoas/entidades. Tudo o que se considerou relevante apresenta-se sistematizado num documento anexo, a publicar também pelo CNE, devendo este ser lido previamente, para uma compreensão mais completa do enquadramento destas mesmas Recomendações.

Recomendações a ter em conta no regresso dos alunos à Escola e no início e acompanhamento do próximo ano escolar e seguintes

1 - Bem-estar e progressão nas aprendizagens. Acolhimento e diagnóstico

Recomenda-se que:

1.1 - Na preparação do próximo ano letivo e consequente regresso às aulas em setembro próximo, a principal preocupação, por parte das escolas, seja ouvir as crianças e jovens e identificar as condições psicoafetivas e de aprendizagem de cada um deles para que se possa atuar nestas duas frentes - aprendizagens essenciais e estruturantes e bem-estar emocional;

1.2 - Se identifiquem aprendizagens estruturantes que não foram adquiridas ou consolidadas pelos alunos e se definam estratégias para obviar as situações mais graves, de preferência sem recorrer a "mais do mesmo" (que pode ir do aumento da carga letiva, à manutenção de estratégias pedagógicas fomentadoras da passividade dos alunos);

1.2.1 - Se tenha em especial atenção os alunos que irão frequentar em 2021/2022 o 3.º ano de escolaridade, ano charneira no seu percurso escolar, em particular quanto às aprendizagens inerentes à literacia da leitura, da escrita e da oralidade, já que foram fortemente afetados nos dois primeiros anos de escolaridade;

1.2.2 - Se tenha especial cuidado com os alunos que estiveram afastados da escola na sua versão digital, ou aqueles que sofreram maior abandono ou dificuldades por motivos diversos;

1.3 - Sejam planeadas e reforçadas medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, e recursos e apoios especializados, para garantir a adequação às necessidades e potencialidades específicas de cada aluno, sobretudo daqueles que já revelavam maiores dificuldades e que, com a situação pandémica, foram ainda mais afetados, para que possam retomar o progresso regular das suas capacidades e aprendizagens, sem qualquer estigmatização;

1.4 - Se possa proporcionar, em colaboração com outras entidades da comunidade, atividades e espaços não escolarizados de socialização e integração, a iniciar já em setembro próximo e com sistematicidade ao longo do ano letivo, e que podem assumir diversas formas (visitas culturais ou de contacto com a natureza, jogos colaborativos, dinâmicas de conhecimento e acolhimento mútuo, entre muitas outras possibilidades);

1.5 - Se fomentem iniciativas organizadas ao nível das comunidades e com a supervisão de entidades locais (como autarquias, juntas de freguesia, associações recreativas, organizações não governamentais, etc.), que possam disponibilizar apoio escolar (por exemplo, no apoio ao estudo) a crianças e jovens com mais dificuldades - ou a todos os que o desejem - numa base semanal, de forma gratuita e voluntária, com a colaboração de professores aposentados ou de estudantes de níveis de escolaridade mais avançados, a título de exemplo.

2 - Currículo e gestão do currículo

Recomenda-se que:

2.1 - Sejam revistas, a nível de escola e agrupamento, as planificações de ensino e que estas sejam reelaboradas numa perspetiva de ciclo de escolaridade;

2.2 - Se use a flexibilidade curricular para reforçar conhecimentos, capacidades e atitudes identificados como menos apreendidos e consolidados em anos letivos anteriores;

2.3 - Se dê cada vez mais, voz aos alunos(3), procurando envolvê-los, desde o 1.º ciclo, no planeamento do ano letivo e negociar com as crianças e jovens os objetivos a cumprir, numa lógica de gestão participada e de fomento da cidadania;

2.4 - Se valorize a transdisciplinaridade na abordagem de conteúdos menos consolidados ou de matérias novas, de acordo com necessidades específicas identificadas em cada escola e envolvendo trabalho docente colaborativo e cooperativo.

3 - Práticas pedagógico-didáticas e de avaliação

Recomenda-se que:

3.1 - Se relativize o impacto do número de dias "perdidos" e se valorize sobretudo a tranquilidade, a calma, o equilíbrio no regresso à escola, mantendo tanto quanto possível o tempo das interrupções letivas, embora, se mais favorável, com redistribuição das mesmas (mais frequentes, mais curtas com uma organização letiva semestral ou bimestral, por exemplo);

3.2 - Se recorra mais ao trabalho colaborativo entre professores (do mesmo departamento, da mesma turma, de várias turmas, do mesmo ano de escolaridade.) desde a planificação, à elaboração de tarefas e ao desenho de formas e instrumentos de avaliação;

3.3 - Se potenciem as competências digitais adquiridas por professores e alunos, e se recorra a diferentes ferramentas tecnológicas para desenvolver capacidades de autonomia, cooperação, investigação, espírito crítico, etc.;

3.4 - Se desenvolvam, durante o horário escolar, práticas de ensino-aprendizagem mistas, com componente presencial e a distância (blended learning) e com a metodologia adequada;

3.5 - Se invista em práticas de aprendizagem ativa e colaborativa, em projetos transversais, em metodologias de resolução de problemas, como práticas privilegiadas de envolvimento e integração dos alunos e na abordagem de aprendizagens curriculares em falta;

3.6 - Se trabalhe, quando necessário, em regime de coadjuvação, de tutorias, de acompanhamento de pequenos grupos, ou através de outras formas que permitam o seguimento de cada aluna e de cada aluno;

3.7 - Se fomente o desenvolvimento de parcerias de acompanhamento mútuo entre os alunos e, nos âmbitos em que isso seja favorável, de seguimento de alunos mais novos por alunos mais velhos, em regime, por exemplo, de voluntariados juvenis;

3.8 - Se desenvolvam ações que incidam sobre a literacia da leitura, da escrita e da oralidade, de forma transversal, e se melhorem essas capacidades ao longo de todo o percurso educativo;

3.9 - Se invista na literacia científica, através do trabalho exploratório e de planos específicos para a literacia matemática estruturante;

3.10 - Se reforce a atividade física e a prática desportiva, e se utilizem frequentemente atividades ao ar livre de forma a obviar os tempos de sedentarismo e confinamento, a falta de socialização e as consequências negativas dessas vivências para a saúde física (como, por exemplo, o aumento da obesidade infantil) e mental (como pode ser o caso de uma maior incidência de problemas associados ao cyberbullying) de crianças e jovens;

3.11 - Se potencie a educação artística e o recurso a diferentes formas de expressão artística para o inerente desenvolvimento pessoal e para o benefício na comunicação e na sociabilização;

3.12 - Se dê mais relevância ao tempo informal e cultural das aprendizagens e se procure integrar os conhecimentos das crianças e dos jovens que provêm destes espaços e experiências;

3.13 - Se privilegie a finalidade formativa da avaliação, com recurso a diversas formas e instrumentos.

4 - Formação de pessoal docente e reforço de condições e recursos

Recomenda-se que:

4.1 - Se consolide e alargue formação abrangente no uso educativo de ferramentas tecnológicas;

4.2 - Se incentive a formação com componente de acompanhamento e monitorização em contexto e que conte "com a participação ativa e autónoma dos formandos (...) numa diversidade de processos em que o estudo, a discussão, a reflexão, a pesquisa, as práticas e as experiências de cada um podem e devem ser mobilizadas, integradas e utilizadas para resolver as questões e/ou os problemas suscitados"(4);

4.3 - Se preveja, planeie e, quando necessário, se reforcem medidas e recursos decorrentes da autonomia das escolas para garantir as necessidades em função dos objetivos, considerando a premência de apoios mais personalizados, ou em grupos mais eficientes, nomeadamente no recurso à coadjuvação e na flexibilização de horários, organização de grupos/turma, ou gestão do calendário escolar;

4.4 - Se preveja, no horário de trabalho de escola dos docentes, tempo para trabalho colaborativo, flexibilidade para desempenho de diversas tarefas, crédito para formação;

4.5 - Se dotem as escolas com uma ligação de rede (Internet) robusta, rápida e eficaz e com equipamentos tecnológicos adequados;

4.6 - Se planeie e reforce, nas escolas e/ou nos territórios, as equipas multidisciplinares com tempo disponível para cada escola, para desenvolver um efetivo trabalho social de responsabilidade e colaboração com as famílias, na prevenção do abandono e do absentismo, da indisciplina e na mediação de conflitos e na promoção de relações interpessoais saudáveis.

5 - Lideranças, trabalho colaborativo e equipas multidisciplinares

Recomenda-se que:

5.1 - Se valorize a capacidade de trabalho colaborativo dentro das próprias escolas, em todos os níveis de responsabilidades e funções;

5.2 - Se valorize o papel determinante que as lideranças intermédias desempenham na visão estratégica da escola e na gestão das relações internas, com as famílias e com os territórios;

5.3 - Se reforcem as equipas multidisciplinares que trabalhem de forma permanente com um delimitado grupo de escolas ou agrupamentos e que incluam diversos profissionais especializados (psicólogos, licenciados em Ciências da Educação, técnicos de serviço social, animadores sociais) de forma a ser desenvolvido um plano de promoção da saúde mental e física, do bem-estar sociofamiliar e de fomento do sucesso educativo e social de crianças e jovens, destacando-se neste enquadramento a promoção de competências de gestão emocional e de autorregulação em diferentes idades, de hábitos saudáveis e métodos de organização e estudo, de autonomia crítica na gestão da informação (incluindo a literacia mediática e digital).

6 - Escola e famílias

Recomenda-se que:

6.1 - Se intensifique e consolide o contacto regular com as famílias que a pandemia incrementou, fomentando as reuniões com as famílias, nomeadamente através de meios digitais, permitindo um acompanhamento mais sistemático do desempenho de crianças e jovens, com menor dispêndio de tempo e de meios;

6.2 - Se envolva mais as famílias e legítimos representantes parentais nos planos de atividades e no projeto educativo da escola, implicando-as no seu desenho e na monitorização regular do seu desenvolvimento, proporcionando assim às famílias uma melhor compreensão da cultura da escola e o aprofundamento de um mais forte sentimento de pertença;

6.3 - Se fomentem espaços de convivialidade entre gerações que a escola pode oferecer nas suas atividades extracurriculares e festividades (onde possa haver, por exemplo, a apresentação de trabalhos das crianças e dos jovens, concertos, espetáculos.) possibilitando às famílias, num trabalho articulado com as equipas multidisciplinares, um maior envolvimento na resposta direta às necessidades criadas ou exacerbadas com a pandemia;

6.4 - Se criem oportunidades para a promoção do desenvolvimento da literacia digital dos pais e encarregados de educação, quer dentro, quer fora do espaço da escola, em projetos de interação com as famílias que envolvam parcerias locais;

6.5 - Se atenda de forma mais estrutural (políticas públicas) às questões da conciliação trabalho versus família, e se recomende às escolas que envolvam de forma mais equilibrada e, sempre que possível, ambos os progenitores - ou figuras de referência - no acompanhamento escolar de crianças e jovens, dados os benefícios mútuos, ao nível do conhecimento partilhado e da gestão do tempo;

6.6 - Se ampliem as ofertas de educação e cuidados para a primeira infância, seja ao nível de creche, seja de jardim-de-infância e de educação pré-escolar, para que todas as crianças com menos de 6 anos de idade possam usufruir de espaços de aprendizagens significativas e lúdicas, em que o cuidar e o educar surjam intimamente ligados, e onde as potencialidades físicas e psicológicas de cada ser em desenvolvimento encontrem ambientes protetores e estimulantes (também preparatórios para a escola);

6.7 - Se fomente nos pais e nas mães a importância do aprender ao longo da vida, motivando os próprios adultos para investirem na sua formação e qualificações, de forma a estarem mais preparados quer para acompanhar o percurso escolar das crianças e jovens, quer para os desafios do mundo profissional, ou outros, que possam vir a enfrentar.

7 - Escola e comunidade(5)

Recomenda-se que:

7.1 - Se fomente a articulação da escola com as entidades da comunidade local, que estão inseridas nos territórios e que têm um conhecimento próximo das problemáticas das populações, para o desenvolvimento de projetos inseridos no plano de desenvolvimento da escola (IPSS, ONG, empresas, entidades do setor social, cultural e desportivo, empresarial e de voluntariado, movimento associativo, etc.);

7.2 - Se recorra ao Plano Nacional das Artes para apoiar a criação e o desenvolvimento do projeto cultural da escola e a sua ligação com a comunidade, valorizando os recursos endógenos e a identidade cultural de cada território;

7.3 - Se incrementem, entre as bibliotecas escolares e as entidades locais, atividades de animação à leitura com grupos heterogéneos que evidenciem, tanto quanto possível, a diversidade cultural e étnica dos territórios, de forma a reforçar aprendizagens diversas e uma maior socialização e conhecimento mútuo;

7.4 - Se fomente a oferta, por parte das autarquias, de atividades lúdicas nas férias escolares, que englobem estratégias pedagógicas alicerçados na cultura local (passeios verdes, conhecimento de museus, leituras nas bibliotecas, roteiros desportivos, etc.), de forma desejavelmente gratuita ou adequada aos recursos financeiros das famílias, para que as crianças e os jovens possam fazer aprendizagens significativas em momentos de lazer;

7.5 - Se garanta às famílias o funcionamento de atividades de apoio à Família, p. ex., Componente de Apoio à Família e Atividades de Tempos Livres (ATL), e outras respostas a preços acessíveis, para que as crianças fiquem em segurança, possam fazer algumas atividades lúdicas e recreativas e não permaneçam tão isoladas dos seus pares e sem supervisão de pessoas adultas fora dos períodos escolares;

7.6 - Se criem, em articulação com as autarquias, empresas e outras instâncias, espaços de apoio aos projetos de vida dos jovens que abandonaram a escola sem terem concluído a escolaridade obrigatória ou daqueles que nela permanecem, mas no limiar do abandono a curto ou a médio prazo;

7.7 - Se permita que as escolas funcionem, na sua relação com as diversas entidades da comunidade, de acordo com o princípio da subsidiariedade: "garantir um determinado grau de autonomia a uma autoridade subordinada a uma instância hierarquicamente superior, ou a uma autoridade local em relação ao poder central, o que implica uma repartição de competências entre diversos níveis de poder"(6).

8 - Formação inicial de professores e de outros profissionais durante a crise pandémica

Muitos futuros professores e outros profissionais especializados que podem vir a exercer funções nas escolas (como educadores de infância, psicólogos e licenciados em Ciências da Educação), viram-se privados da componente prática da sua formação inicial durante a pandemia. Daí, as seguintes recomendações, dirigidas àqueles que, durante este período, não tiveram oportunidade de obviar ou colmatar esta lacuna:

8.1 - Recomenda-se uma atenção particular aos jovens professores que completaram a sua formação inicial em instituições do ensino superior durante a crise pandémica, e que viram coartada pelo confinamento obrigatório a sua formação prática em contexto de escola, para que possam usufruir, em casos devidamente identificados e justificados, de um período de práticas letivas e escolares devidamente supervisionado;

8.2 - A recomendação anterior aplica-se igualmente a todos os outros profissionais que podem vir a exercer funções nas escolas e que, por terem concluído a sua formação inicial durante os meses da pandemia, não puderam desenvolver competências de aplicação direta dos conhecimentos e de comunicação através do contacto presencial com crianças e jovens em contextos escolares.

Recomendações a ter em conta no desenho e implementação de políticas educativas e formativas, administrativas e sociais

Recomenda-se, ao Ministério da Educação, ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e às outras instâncias governativas com influência nestas decisões, que:

1 - Sejam reavaliados os Documentos Curriculares em vigor e, nos casos necessários, sejam reformulados por forma a disponibilizar um referente curricular coerente, focado e flexível;

2 - Se dê mais condições às escolas para desenvolver, nos Agrupamentos e nas comunidades, educação regular nas expressões, nas artes e no desporto, permitindo a gestão mais autónoma dos recursos e a contratação de professores especialistas das correspondentes áreas;

3 - Se estude a reorganização do ensino secundário de forma a manter o 10.º ano mais livre e transversal aos diferentes percursos de conclusão do ensino obrigatório, relegando para os 11.º e 12.º anos a escolha das vias de conclusão e acesso ao ensino superior, podendo também, nestes anos, haver flexibilidade e permeabilidade entre os diversos desenhos curriculares e recurso à modalidade de ensino híbrido (remoto e presencial);

4 - Se incida sobre a valorização social e educativa dos Cursos Profissionais e se atualizem as suas ofertas formativas, com a consequente adequação de espaços e equipamentos, contratação de professores e técnicos especializados, e com uma apropriada articulação com o ensino superior;

5 - Se melhorem as condições necessárias para o bom desenvolvimento dos Cursos Artísticos Especializados, incluindo a qualidade dos espaços e equipamentos, a contratação dos professores especializados e a articulação com o ensino superior;

6 - Se atenda às desigualdades a que jovens de alguns municípios e regiões estão sujeitos, dado o reduzido leque de ofertas de vias de finalização do ensino secundário, o que inviabiliza verdadeiras escolhas, e se contemple, nestes casos e de forma a criar maior liberdade de escolha onde a escala humana não permite abrir escolas ou criar turmas, a possibilidade de, aproveitando as funcionalidades do ensino remoto conjugadas com momentos presenciais, oferecer, com caráter de excecionalidade, algumas disciplinas que vão ao encontro das opções dos alunos, em termos de áreas de conclusão do ensino obrigatório e de acesso ao ensino superior;

7 - Se reveja o acesso ao Ensino Superior, dentro do quadro definido na LBSE e na linha da Recomendação CNE n.º 6/2020(7), por forma a que a conclusão do Ensino Secundário não esteja condicionada por este acesso, nem as provas que para ele se realizem induzam práticas letivas e de aprendizagem baseadas, quase exclusivamente, no treino e na memorização;

8 - Se reativem programas e planos de intervenção, nas escolas e nos territórios, que já demonstraram dar bons resultados (Programa Nacional do Ensino do Português, Programa de Formação em Ensino Experimental das Ciências, Plano de Ação para a Matemática, entre outros) e se consolidem ou criem outros planos de intervenção nacional ou local (Plano Nacional de Leitura, Plano Nacional das Artes, Desporto Escolar, e.g.);

9 - Se considere reconhecer o voluntariado juvenil, nas suas diferentes expressões e potencialidades, como forma de enriquecimento pessoal e curricular no percurso educativo das crianças e jovens;

10 - Em colaboração com o IAVE E. P., se continue a proporcionar uma ampla aferição do sistema educativo e das escolas como meio de avaliação continuada e sistematizada do processo educativo e do sucesso dos alunos;

11 - Em colaboração com a IGEC se trabalhe no sentido de recuperar nesta uma intervenção preponderantemente pedagógica junto das escolas (em detrimento da função classificativa);

12 - Se reforcem as equipas multidisciplinares nas escolas com a contratação de técnicos especializados e de assistentes operacionais, de acordo com a Recomendação do CNE n.º 4/2020 sobre A condição dos assistentes e dos técnicos especializados que integram as atividades educativas das escolas(8) e se providencie a formação contínua necessária;

13 - Se regulamente a lei dos Conselhos Municipais de Educação, constituídos por representantes das escolas, dos legítimos representantes de pais, dos sindicatos, das organizações, das autarquias, da saúde, da segurança social e outros parceiros sociais, avaliando as correspondentes competências vinculativas e definindo com clareza as competências essenciais correspondentes à autonomia das escolas;

14 - Se desenhem políticas educativas estritamente articuladas com políticas sociais, para que dada a centralidade da pessoa que aprende esta veja respeitadas e acauteladas, em primeiro lugar, as suas necessidades básicas, como a alimentação, a habitação, a saúde e a segurança.

(1) As Comissões Especializadas consultadas foram a 1.ª Comissão - Necessidades e desafios educativos das crianças (0 - 15 anos) e a 2.ª Comissão - Necessidades e desafios educativos dos jovens (15 - 24 anos)

(2) Cf. Menezes Junior, Pedro V. (2020). A Educação nos Tempos da Peste: uma análise sobre a representação da educação nos media na primeira vaga da pandemia. Tese de Mestrado em Ciências da Educação (não publicada), apresentada à Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (Orientação de Norberto Ribeiro e Isabel Menezes).

(3) Cf. Conselho Nacional de Educação, Relatório Técnico (março 2021) e Recomendação (junho 2021), A voz das crianças e dos jovens na educação.

(4) Cf. conclusões do relatório do Projeto Maia. Fernandes, D., Machado, E. A., & Candeias, F. (2020). Para uma avaliação pedagógica: dinâmicas e processos de formação no projeto MAIA (2019-2020). Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral de Educação.

(5) Cf. Recomendação n.º 1/2019 sobre Transferência de competências para as autarquias locais e entidades intermunicipais, Diário da República n.º 21, Série II, de 30 de janeiro de 2019, disponível em https://www.cnedu.pt/content/deliberacoes/recomendacoes/Recomendacao-DR_1_2019.pdf

(6) Retirado de "Fichas temáticas sobre a União Europeia". Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/factsheets/pt/sheet/7/o-principio-da-subsidiariedade (consultado em 01 de maio de 2021).

(7) Recomendação n.º 6/2000 do CNE sobre O acesso ao ensino superior e a articulação com o ensino secundário e publicada no Diário da República n.º 232/2020, Série II de 2020-11-27; disponível em: https://dre.pt/web/guest/home/-/dre/149839983/details/maximized

(8) Recomendação n.º 4/2020, sobre A condição dos assistentes e dos técnicos especializados que integram as atividades educativas das escolas e publicada no Diário da República n.º 207/2020, Série II de 2020-10-23; disponível em: https://dre.pt/home/-/dre/146202135/details/maximized

9 de junho de 2021. - A Presidente, Maria Emília Brederode Santos.

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